Com informações da Agência Fapesp - 16/08/2016
Vácuo material
A resistência ao movimento oferecida pelo vácuo pode estar desacelerando a rotação ultrarrápida das estrelas de nêutrons conhecidas como pulsares.
A hipótese instigante foi elaborada por pesquisadores brasileiros.
Vale lembrar que, para a mecânica quântica, o vácuo não é realmente vazio, mas extremamente dinâmico, permeado por flutuações locais de potencial que produzem o tempo todo pares de partículas e antipartículas, que se aniquilam em seguida.
Assim, por mais tênue que possa ser o espaço interestelar, ele não é um espaço vazio, mas um vácuo quântico, cujo efeito sobre corpos altamente compactos em rotação, como as estrelas de nêutrons, não pode ser negligenciado.
"As observações astronômicas mostram que, a cada segundo, o período de rotação dos pulsares atrasa de um centésimo trilionésimo (10-14) a um décimo trilionésimo (10-13) de segundo. O mecanismo clássico de perda de energia, por radiação de dipolo magnético, não é suficiente para explicar esse atraso. É preciso considerar algo mais. Nosso estudo nos levou a concluir que esse componente adicional poderia ser a frenagem exercida pela fricção do vácuo quântico", explicou Jaziel Goulart Coelho, do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Fricção do vácuo quântico
Atualmente são conhecidos cerca de 2 mil pulsares. Mas, devido a grandes dificuldades no processo de observação, apenas nove deles têm os seus parâmetros bem estabelecidos. O que os pesquisadores brasileiros fizeram foi reunir os dados relativos a esses nove pulsares e lidar com eles com base em primeiros princípios, ou conceitos da física fundamental.
Os modelos mostraram que, além da perda de energia devida à radiação eletromagnética, um outro fator deve estar contribuindo para a desaceleração do movimento de rotação, e este fator seria a fricção do vácuo quântico (quantum vacuum friction, ou QVF).
"Os períodos de rotação dos pulsares, bem como suas variações temporais, são determinados observacionalmente. A partir deles, é possível calcular o chamado índice de frenagem (brake index), caracterizado pelo atraso de 10-14 a 10-13 segundo por segundo. Para explicar esse índice, combinamos dois mecanismos de perda de energia: a radiação de dipolo magnético clássica e a fricção do vácuo quântico. Investigamos o papel da QVF como mecanismo adicional. Foi um trabalho de astrofísica teórica aplicado a observáveis", resumiu Jaziel.
Atrito gera calor
E para onde vai a energia subtraída dos pulsares pela fricção do vácuo quântico?
Os pesquisadores afirmam que, para uma resposta inteiramente conclusiva, são necessários mais estudos. Porém, eles adiantam que a produção de calor está intrinsecamente associada à QVF. Esta é uma das consequências da interação de um campo magnético muito forte com um meio supermagnetizado. O calor surge da "fricção" do vácuo (visto agora como um meio material) com a superfície da estrela, da mesma forma que o movimento de uma pá na água por um longo tempo pode aquecê-la.
"Parece também importante compreender melhor sob o ponto de vista teórico as consequências do calor associado à QVF. Até que ponto ele influencia a temperatura da superfície do pulsar? A presença desse calor é importante para outras classes de estrelas?", destaca o pesquisador, apontando as perguntas que guiarão os novos estudos.