Redação do Site Inovação Tecnológica - 19/02/2025
Densidade de armazenamento
Os 0s e 1s binários na memória de um computador tipicamente são transistores operando em baixa ou alta voltagem. Em um disco compacto, o 1 é um ponto onde um pequeno "poço" se transforma em uma "terra" plana ou vice-versa, enquanto um 0 é quando não há mudança.
Assim, historicamente, a densidade de armazenamento de qualquer dispositivo de memória digital é limitado pelo menor tamanho possível com que se pode construir o objeto que representa os 0s e 1s - e, sejam transistores, sejam domínios magnéticos ou pontos ópticos, cada um desses bits tem um número quase incontável de átomos.
Mas isso agora poderá mudar muito rapidamente, levando os bits diretamente para a escala atômica, onde cada 0 e cada 1 será representado por único átomo.
E quem está por trás desse salto na miniaturização é o brasileiro Leonardo França, atualmente na Universidade de Chicago, nos EUA.
Defeitos cristalinos
Leonardo aprimorou uma técnica para criar 0s e 1s a partir de defeitos no interior de cristais, sendo que cada um desses defeitos tem o tamanho de um átomo individual. E, apesar de ter entrado no domínio amplamente controlado pela mecânica quântica, a inovação ainda é perfeita para aplicações clássicas na memória de computadores.
"Encontramos uma maneira de integrar a física do estado sólido aplicada à dosimetria de radiação com um grupo de pesquisa que trabalha fortemente em quântica, embora nosso trabalho não seja exatamente quântico," disse Leonardo. "Há uma demanda por pessoas que estejam fazendo pesquisas em sistemas quânticos, mas, ao mesmo tempo, há uma demanda para melhorar a capacidade de armazenamento das memórias não voláteis clássicas. E é nessa interface entre o armazenamento de dados quânticos e ópticos que nosso trabalho está fundamentado."
"É impossível encontrar cristais - na natureza ou artificiais - que não tenham defeitos. Então, o que estamos fazendo é tirar vantagem desses defeitos," acrescentou Leonardo.
Bit atômico
Em essência, nesta nova abordagem cada bit é representado por um átomo faltando na rede cristalina do material que for usado para construir a memória.
Para ler e escrever nesses defeitos, Leonardo usou dosímetros de radiação, dispositivos mais comumente usados para detectar a quantidade de radiação que os trabalhadores de hospitais absorvem das máquinas de raio X. Ele teve essa ideia ainda na USP (Universidade de São Paulo), mas agora ele passou a usar os dosímetros para criar um sistema de armazenamento de memória microeletrônica.
"Nos hospitais e nos aceleradores de partículas, por exemplo, é necessário monitorar a quantidade de dose de radiação à qual as pessoas são expostas," explicou ele. "Existem alguns materiais que têm essa capacidade de absorver radiação e armazenar essa informação por um certo período de tempo."
O pulo do gato está em substituir a radiação por uma técnica óptica - um pulso de luz - que também faz o mesmo serviço, "ativando" o bit no defeito cristalino ou apagando-o.
Inspiração quântica, memória clássica
Para criar a nova técnica de armazenamento de memória, a equipe adicionou íons de terras raras, um grupo de elementos também conhecidos como lantanídeos, a um cristal.
Especificamente, eles usaram um elemento de terras raras chamado praseodímio e um cristal de óxido de ítrio, mas o processo pode ser usado com uma variedade de materiais, aproveitando as propriedades ópticas fortes e flexíveis das terras raras.
"É bem conhecido que terras raras apresentam transições eletrônicas específicas, que permitem escolher comprimentos de onda de excitação de laser específicos para controle óptico, desde regimes de UV até o infravermelho próximo," explicou Leonardo.
Diferentemente dos dosímetros, que são tipicamente ativados por raios X ou raios gama, o dispositivo de armazenamento é ativado por um simples laser ultravioleta. O laser estimula os átomos dos lantanídeos, que por sua vez liberam elétrons. Os elétrons são aprisionados por alguns dos defeitos do cristal de óxido, por exemplo pelas lacunas individuais (cargas positivas) na estrutura onde um único átomo de oxigênio deveria estar, mas não está.
Embora esses defeitos cristalinos sejam frequentemente usados em pesquisa quântica, entrelaçados para criar qubits no diamante e, mais recentemente, na pedra semipreciosa espinélo, a equipe encontrou outro uso para eles. Os dosímetros de radiação permitem orientar quando os defeitos são carregados e quando não são. Ao designar uma lacuna carregada como 1 e uma lacuna não carregada como 0, o cristal foi transformado em um poderoso dispositivo de armazenamento de memória em uma escala nunca vista na computação clássica.
"Dentro desse cubo milimétrico, demonstramos que há pelo menos um bilhão dessas memórias - memórias clássicas, memórias tradicionais - baseadas em átomos," comemorou o professor Tian Zhong, coordenador da pesquisa.
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