Redação do Site Inovação Tecnológica - 15/06/2021
Cristais de ferro
Dados observacionais colhidos nos últimos 30 anos vêm mostrando que o ferro cristalizado no núcleo da Terra parece estar preferencialmente alinhado ao longo do eixo de rotação da Terra, mais no oeste do que no leste.
Os indícios desse alinhamento vêm de medições do tempo que as ondas sísmicas de terremotos levam para viajar através do núcleo interno. Essas ondas sísmicas viajam mais rápido na direção do eixo de rotação norte-sul do que ao longo do equador, uma assimetria que os geólogos atribuem aos cristais de ferro - que são assimétricos - tendo seus longos eixos preferencialmente alinhados ao longo do eixo da Terra.
Uma equipe de geofísicos do EUA e da França está propondo agora um novo modelo científico que poderia explicar essa assimetria como se originando de um crescimento assimétrico que estaria ocorrendo ao longo do último 1,5 bilhão de anos.
Vale lembrar que um modelo científico é uma explicação simplificada de uma realidade cuja totalidade não se conhece e que faz sentido com pelo menos a maior parte dos dados disponíveis e com as teorias mais aceitas.
Daniel Frost e seus colegas criaram um modelo computacional de crescimento dos cristais de ferro no núcleo interno que incorpora modelos de crescimento geodinâmico e a física mineral do ferro sob alta pressão e alta temperatura.
"O modelo mais simples parecia um pouco incomum - que o núcleo interno é assimétrico," contou Frost. "O lado oeste parece diferente do lado leste até o centro, não apenas no topo do núcleo interno, como alguns sugeriram. A única maneira de explicar isso é um lado crescendo mais rápido do que o outro."
Núcleo da Terra assimétrico
O modelo descreve como um crescimento assimétrico - cerca de 60% maior no leste do que no oeste - pode orientar preferencialmente os cristais de ferro ao longo do eixo de rotação do planeta, com mais alinhamento no oeste do que no leste, o que bate com a diferença na velocidade das ondas sísmicas ao longo do núcleo central.
Se o modelo estiver correto, alguma coisa no núcleo externo da Terra, ou no manto, sob a Indonésia está removendo calor do núcleo interno em uma taxa mais rápida do que no lado oposto, sob o Brasil. O resfriamento mais rápido de um lado aceleraria a cristalização do ferro e o crescimento do núcleo interno desse lado.
"O que estamos propondo neste artigo é um modelo de convecção sólida desequilibrada no núcleo interno que reconcilia observações sísmicas e condições de contorno geodinâmicas plausíveis," disse a professora Barbara Romanowicz, coautora do trabalho.
Como é o núcleo da Terra?
O interior da Terra parece ser formado por camadas, como uma cebola. O núcleo interno de ferro-níquel sólido - com estimados 1.200 quilômetros de raio, ou cerca de três quartos do tamanho da Lua - é cercado por um núcleo externo fluido de ferro fundido e níquel, com cerca de 2.400 quilômetros de espessura. O núcleo externo é cercado por um manto de rocha quente com 2.900 quilômetros de espessura e coberto por uma crosta rochosa fina e fria na superfície.
A convecção ocorre tanto no núcleo externo, que ferve lentamente à medida que o calor da cristalização do ferro sai do núcleo interno, quanto no manto, conforme a rocha mais quente se move para cima para transportar esse calor do centro do planeta para a superfície. Acredita-se que seja o movimento vigoroso de ebulição no núcleo externo de ferro líquido que produza o campo magnético da Terra.
O novo modelo prevê corretamente as observações sobre os tempos de viagem das ondas sísmicas através do núcleo interno: Essa anisotropia, ou diferença nos tempos de viagem paralelos e perpendiculares ao eixo de rotação, aumenta com a profundidade, e a anisotropia mais forte é deslocada para o oeste do eixo de rotação da Terra em cerca de 400 quilômetros.
O modelo de crescimento do núcleo interno também estabelece limites para a proporção de níquel em relação ao ferro no centro da Terra. Isso porque o modelo não reproduz com precisão as observações sísmicas a menos que o níquel represente entre 4% e 8% do núcleo interno - o que é próximo à proporção em meteoritos metálicos, que se presume terem sido um dia os núcleos de planetas anões em nosso Sistema Solar. O modelo também propõe que o núcleo interno da Terra seria mais viscoso do que os geólogos teorizavam até agora.