Redação do Site Inovação Tecnológica - 03/06/2019
Metano abiótico
Há anos, um grupo crescente de cientistas tenta mostrar por meios observacionais que o petróleo e o gás natural podem não ser fósseis.
Agora, a equipe do Observatório Carbono Profundo, um esforço internacional de 10 anos para explorar os segredos mais profundos da Terra - o projeto termina em Outubro próximo - acredita ter encontrado provas definitivas de que nem todos os depósitos de metano se originam de restos enterrados de vida ancestral.
Mais do que isso, os mais de 230 cientistas de 35 países que fazem parte do projeto acreditam que o metano abiótico - metano que não se origina de restos vivos - pode ter sido o catalisador para o florescimento da vida na Terra, assim como pode atuar em outros planetas e luas.
Origem do metano
Durante os últimos cem anos, os cientistas vêm tratando os hidrocarbonetos como "combustíveis fósseis", com uma origem biótica - derivada de plantas, animais e algas enterrados nas eras primordiais da Terra.
Mas, para alguns hidrocarbonetos, especialmente o metano - o principal ingrediente do gás natural -, a natureza tem muitas receitas, algumas das quais são abióticas, derivadas não da decomposição da vida pré-histórica, mas criadas inorganicamente por processos geológicos e químicos profundos.
A equipe do Observatório Carbono Profundo acredita que uma origem abiótica do metano explica a maioria das ocorrências incomuns do gás, incluindo as chamas do Monte Quimera, no sudoeste da Turquia, onde dezenas de pequenas chamas têm queimado constantemente por milênios. Ocorre que a região não está sobre depósitos convencionais de petróleo e gás produzidos hipoteticamente a partir de resíduos orgânicos em decomposição de épocas passadas.
Mas não é um exemplo isolado: "Até agora, foram encontradas centenas de locais com fontes abióticas de metano em mais de 20 países e em várias regiões oceânicas profundas," diz o professor Giuseppe Etiope, do Instituto Nacional de Geofísica e Vulcanologia de Roma, na Itália.
Embora diversos tipos de rochas estejam presentes em todos esses ambientes, observa Etiope, muitas descobertas se concentraram em locais com tipos específicos de rochas ultramáficas, como peridotito (rocha ígnea de granulação grosseira), incluídas em maciços e ofiolitos, conjuntos de rochas formados a partir da erupção submarina do material da crosta oceânica e do manto superior.
A equipe acredita que o metano abiótico da Terra deriva quimicamente principalmente do hidrogênio criado pela hidratação das rochas ultramáficas submetidas à "serpentinização" - uma reação que ocorre quando a água encontra o mineral olivina.
O hidrogênio e a vida
O hidrogênio também nutre fontes biológicas de metano. Os pesquisadores do Observatório Carbono Profundo documentaram um vasto ecossistema microbiano, uma profunda biosfera alimentada por hidrogênio. Muitos dos micróbios profundos, chamados metanogênicos, metabolizam o hidrogênio para produzir metano.
Essa biosfera profunda acaba por apresentar um cenário como o do ovo e da galinha: O que veio primeiro, o metano abiótico ou os micróbios? Se o metano abiótico veio primeiro, como parece óbvio, segundo a equipe, ele deu origem aos primeiros micróbios da Terra? E se os micróbios vieram primeiro, como e por que eles habitaram lugares quase desprovidos de sustento?
"Entramos neste projeto pensando que sabíamos como o metano abiótico se formava. O que estamos aprendendo é que é muito mais complicado e a maior chave é o hidrogênio. Com uma maior compreensão de como as rochas produzem o hidrogênio do qual o metano deriva, e com que rapidez essa reação acontece, estaremos muito mais próximos de saber quanto de metano existe na Terra," disse o professor Edward Young, da Universidade da Califórnia em Los Angeles.
"Temos evidências claras e crescentes de metano abiótico na Terra. O que não está claro é o quanto existe. Essas investigações encontraram uma incrível complexidade na maneira como o metano é produzido, e essas complexidades conectam a química inorgânica e orgânica na Terra de maneiras fascinantes," acrescentou Isabelle Daniel, da Universidade Claude Bernard Lyon 1, na França.