Com informações da New Scientist - 12/02/2020
Fronteira entre clássico e quântico
Um novo método para manipular o estado quântico de partículas abre caminho para nos permitir observar um objeto em dois lugares ao mesmo tempo - é bom lembrar que a ação fantasmagórica à distância já é visível.
Por enquanto, a técnica foi usada para resfriar uma pequena esfera de vidro, fazendo-a atingir um estado que só havia sido observado em partículas atômicas.
O objetivo dessa linha de pesquisas é verificar se existe - e, se existir, onde está - uma fronteira entre os bizarros comportamentos observados pela ação da mecânica quântica e os comportamentos tradicionais, ou "clássicos", a que estamos acostumados na escala humana. Em outras palavras, se a mecânica quântica afeta os objetos macroscópicos.
Resfriamento com luz
Quando se atinge escalas extremamente pequenas, o calor e o movimento são intercambiáveis: quanto mais uma partícula está se movendo, mais quente ela é. Então, para esfriar uma pequena partícula, é necessário fazê-la parar de se mover. Como as regras da mecânica quântica significam que nunca se pode saber exatamente com que rapidez uma partícula está se movendo, há um limite para o quão fria uma partícula pode ficar - esse limite é conhecido como estado fundamental da partícula, ou energia do ponto zero.
Uros Delic e seus colegas da Universidade de Viena, na Áustria, usaram um único laser para resfriar uma partícula de vidro de 150 nanômetros de largura, fazendo-a atingir seu estado fundamental. "Em outros métodos, sempre existem vários lasers e um aparato complicado, mas, neste caso, é apenas um laser e a partícula. Essa é a beleza desse método," disse o professor Markus Aspelmeyer, coordenador da equipe.
O laser levita a partícula usando um efeito chamado aprisionamento óptico, no qual a luz interage com a partícula para mantê-la no lugar. Espelhos de ambos os lados da partícula fazem com que a luz se sobreponha e interfira com ela mesma, criando uma "garra de luz" que mantém a nanoesfera no lugar - essas garras de luz são conhecidas como pinças ópticas ou raios tratores.
Esse padrão de interferência de luz só pode existir em determinadas frequências, de acordo com a mecânica quântica. Isso permite que os pesquisadores selecionem a frequência precisa da luz que atinge a partícula. À medida que a partícula vibra para frente e para trás, algumas frequências de luz a aceleram, fornecendo pequenas quantidades de energia, enquanto outras diminuem a velocidade, removendo energia.
Quando se deixa passar apenas as frequências que retardam a partícula, ela irá ficando cada vez mais fria, até atingir seu estado fundamental - esse "resfriamento com luz" promete coisas interessantes, como geladeiras a laser.
No experimento idealizado por Delic, isso ocorreu a uma temperatura de 0,000012 kelvin (cerca de -273 °C), apenas uma fração acima do zero absoluto, a temperatura mínima possível.
Superposição espacial e gravidade quântica
Métodos semelhantes já foram usados antes para resfriar gases, mas nunca partículas sólidas. Essa técnica poderá eventualmente ser usada para criar um estado quântico no qual um objeto sólido ocupe dois lugares ao mesmo tempo, conhecido como superposição espacial, disse Aspelmeyer.
"Outros experimentos com átomos frios também podem criar superposições e estados quânticos, mas o que eles nunca fizeram foi criar uma superposição de todos os átomos em um lugar e de todos os átomos em outro lugar," acrescentou o professor.
A partícula neste experimento tinha cerca de 100 milhões de átomos, embora apenas seu interior tenha atingido o estado fundamental.
"É engraçado pensar sobre isso: a superfície da nossa esfera de vidro é extremamente quente, em torno de 300 °C, porque o laser aquece os elétrons no material. Mas o movimento do centro de massa da partícula é ultrafrio, em torno de 0,00001 ºC acima do zero absoluto, e podemos mostrar que a partícula quente se move de maneira quântica," disse Delic.
O resfriamento de sólidos e a medição de seu estado quântico é importante para o objetivo final dos pesquisadores de investigar as propriedades quânticas da gravidade, porque é muito mais fácil testar a gravidade de um sólido compacto do que de um gás difuso.
Tal configuração poderia permitir testar se a gravidade do objeto está similarmente em dois lugares ao mesmo tempo e como a gravidade se aplica a objetos quânticos de maneira mais geral, eventualmente dando uma resposta à questão de existirem ou não "partículas de gravidade", ou grávitons.