Redação do Site Inovação Tecnológica - 22/03/2024
Neurociência de código aberto
Os neurônios se comunicam e respondem intrincadamente a estímulos dentro de uma vasta rede, orquestrando funções essenciais, desde processos corporais básicos até pensamentos complexos.
Contudo, os métodos tradicionais da neurociência, que se baseiam na eletrofisiologia (in vivo, dentro de um organismo vivo), são muito localizados, dificultando abordar a complexidade do cérebro como um todo. Uma abordagem alternativa envolve a extração de células do organismo e a realização de estudos em uma placa de cultura (in vitro), proporcionando aos pesquisadores maior controle e precisão na medição de processos neurais; o problema é que cada pesquisador precisa desenvolver seu próprio aparato para lidar com as células.
Agora, Xiaotian Zhang e colegas da Universidade de Illinois, nos EUA, acabam de lançar um sistema in vitro de código aberto e de baixo custo para fazer interfaces com neurônios, oferecendo um caminho mais acessível para pesquisadores interessados em interações neurais.
O trabalho faz parte de um projeto maior, financiado pela Fundação Nacional de Ciências dos EUA (NSF), chamado Mente in Vitro (MiV), que explora como os neurônios interagem entre si, não apenas para compreender melhor as funções subjacentes a sistemas complexos como o cérebro, mas também com o objetivo de eventualmente usar redes neurais in vitro para fins computacionais. Para atingir esse objetivo, o projeto abrange um grupo altamente interdisciplinar de pesquisadores, incluindo pesquisadores de ciência da computação, engenharia, neurobiologia, fisiologia e muito mais.
"O objetivo do projeto MiV é, em última análise, usar neurônios para computação," explicou Zhi Dou, um dos líderes do desenvolvimento do novo sistema de código aberto. "Isso permitiria um sistema dinâmico e em constante evolução, ao contrário dos sistemas de computação tradicionais, e também mais eficiente em termos energéticos."
Mente in Vitro
O sistema mede a atividade dos neurônios usando uma tecnologia chamada matriz de microeletrodos. Embora existam sistemas comerciais que utilizam tecnologia semelhante, eles são caros e comercializados para abordagens experimentais específicas, o que é inadequado para a abordagem genérica pretendida pelo projeto.
"Como estamos interessados em projetar paradigmas de computação a partir de células vivas, nossa motivação para isso foi nos afastarmos dos sistemas comerciais mais padronizados e construirmos nós mesmos algo sobre o qual teríamos controle total," disse Zhang.
No novo aparelho Mente in Vitro, as células são colocadas em uma placa que contém as matrizes de microeletrodos, permitindo que a tecnologia faça interface com os substratos neurais. Os eletrodos detectam a tensão elétrica dos neurônios, e essa voltagem é amplificada e enviada para um computador, que então processa os dados.
Comparado ao sistema comercial padrão de 60 eletrodos, o sistema MiV possui mais de 500 eletrodos, o que permite que mais dados sejam coletados de uma só vez. O sistema também incorpora recursos aprimorados e inéditos em comparação com os sistemas comerciais, como portabilidade, comunicação bidirecional com os neurônios, capacidade de gerar imagens dos neurônios durante o registro dos dados e a capacidade de testar vários tipos de entrada (elétrica e óptica) e várias populações de células de cada vez.
Tecnologia para todos
Apesar de tantas melhorias, o custo de construção do sistema MiV é 10 vezes mais barato do que o custo de um sistema comercial e totalmente personalizável. Para promover a divulgação do sistema, os pesquisadores disponibilizaram seus modelos de hardware e software para o sistema MiV de código aberto gratuitamente online.
"Ter nosso software e hardware de código aberto foi muito importante para nós," disse Zhang. "Queríamos reduzir o custo para disponibilizar esta tecnologia a outros e torná-la mais flexível e versátil para que os pesquisadores possam realmente personalizar suas configurações experimentais para o que precisarem. Nosso sistema não é para apenas um laboratório ou um grupo de pessoas interessadas em uma coisa específica, é para todos."
Os links para os projetos de hardware e software de código aberto podem ser encontrados em https://gazzolalab.github.io/MiV-OH/ e https://miv-os.readthedocs.io/, respectivamente.