Com informações do ESO - 15/01/2024
Da supernova à estrela de nêutrons
Astrônomos descobriram uma ligação direta entre as mortes explosivas de estrelas de grande massa, conhecidas como supernovas, e a formação dos objetos mais compactos e enigmáticos do Universo, as estrelas de nêutrons e os buracos negros.
Com o auxílio do VLT (Very Large Telescope) e do NTT (New Technology Telescope), ambos do Observatório Europeu do Sul (ESO), duas equipes conseguiram observar o resultado de uma explosão de supernova numa galáxia próxima, encontrando assim evidências observacionais de um misterioso objeto compacto deixado para trás, em uma primeira demonstração de uma teoria que é largamente aceita pela comunidade científica há décadas, mas para a qual ainda faltava um endosso observacional.
Quando chegam ao final das suas vidas, as estrelas de grande massa colapsam sob a sua própria gravidade tão rapidamente que o resultado é uma violenta explosão conhecida por supernova. Os astrônomos acreditam que, depois da explosão, o que resta é um núcleo extremamente denso, ou um resto compacto, da estrela. Dependendo da massa da estrela que explode, o resto compacto tanto pode ser uma estrela de nêutrons, um objeto tão denso que uma colher de chá do seu material pesaria cerca de um bilhão de quilogramas na Terra; ou um buraco negro, um objeto do qual nada, nem mesmo a luz, consegue escapar.
Os astrônomos encontraram no passado muitos indícios que apontam para esta cadeia de eventos, tais como a descoberta de uma estrela de nêutrons no seio da Nebulosa do Caranguejo, a nuvem de gás que resultou da explosão de uma estrela que ocorreu quase mil anos atrás. No entanto, nunca este processo foi observado em tempo real, o que significa que evidências diretas de uma supernova deixando para trás um resto compacto têm permanecido elusivas.
Esta nova campanha de observações estabelece uma ligação direta entre esses eventos.
Roubo de energia que vira brilho
Em Maio de 2022, o astrônomo amador da África do Sul, Berto Monard, descobriu a supernova SN 2022jli no braço em espiral da galáxia NGC 157, situada a cerca de 75 milhões de anos-luz de distância de nós. Duas equipes separadas estudaram o resultado da explosão, descobrindo que esta apresentava um comportamento peculiar.
Depois da explosão, o brilho da maioria das supernovas simplesmente desvanece com o tempo, resultando em um declínio suave e gradual na "curva de luz" da explosão. Contudo, o comportamento da SN 2022jli era deveras peculiar: Apesar de o brilho total se desvanecer aos poucos, isso não acontecia de forma suave, apresentando oscilações para cima e para baixo, mais ou menos a cada 12 dias.
"Observamos uma sequência repetitiva de iluminação e desvanecimento da luz nos dados da SN 2022jli," explicou Thomas Moore, da Universidade de Belfaste, na Irlanda. "Trata-se da primeira vez que oscilações periódicas repetidas durante muitos ciclos foram detectadas na curva de luz de uma supernova."
Tanto a equipe de Moore quanto a do professor Lin Yan, do Instituto de Tecnologia da Califórnia, acreditam que a presença de mais de uma estrela no sistema SN 2022jli pode explicar este comportamento. De fato, não é incomum que as estrelas de grande massa partilhem a sua órbita com uma estrela companheira, no que é chamado um sistema binário, e a estrela que deu origem à SN 2022jli não é exceção. No entanto, e o que é notável neste sistema é que a estrela companheira parece ter sobrevivido à morte violenta da sua parceira e os dois objetos, o resto compacto e a estrela companheira, muito provavelmente continuaram em órbita um do outro.
Juntando todas as informações, as duas equipes concordam que, quando a estrela companheira interagiu com o material lançado durante a explosão de supernova, a sua atmosfera rica em hidrogênio tornou-se mais inchada do que o habitual. Depois, quando o objeto compacto deixado pela explosão passa pela atmosfera da companheira, ela vai retirando hidrogênio gasoso e formando um disco quente de matéria em seu torno. Este "roubo" periódico de matéria, ou acreção, produz imensa energia, que foi vista nas observações como variações regulares de brilho.
Apesar das equipes não terem conseguido observar luz vinda do objeto compacto propriamente dito, elas concluíram que este roubo energético só pode ser devido a uma estrela de nêutrons invisível, ou possivelmente a um buraco negro, que retira matéria da atmosfera da estrela companheira.