Anna Dejardin - 28/05/2009
Os maiores esforços da ciência atual estão se concentrando em dois extremos: no lado do muito grande, onde inúmeros observatórios, telescópios e sondas espaciais tentam desvendar os segredos do Universo, e no lado do muito pequeno, onde as nanociências e nanotecnologias têm prometido uma revolução na maioria das áreas da atividade humana.
O maciço e o minúsculo
Um detalhe intrigante é que a maioria dos dispositivos usados para se observar o Universo - o muito grande - somente se tornou possível graças ao desenvolvimento das nanotecnologias - o muito pequeno. Por exemplo, os sensores que captam a luz em diversos comprimentos de onda, em sua maior parte invisíveis aos olhos humanos, são feitos com a nanotecnologia do chips e sensores de imagem, cujas unidades básicas medem apenas algumas dezenas de nanômetros (10-9 metro).
Agora, uma pesquisa feita na Universidade de Londres está estreitando ainda mais os laços entre esses dois extremos, criando dispositivos ainda menores, de dimensões equivalentes a poucas moléculas, mas que poderão captar informações com um impacto gigantesco.
Energia do ponto zero
O estranho acoplamento entre o maciço e o minúsculo é consequência da hipótese de que o vácuo do espaço pode não ser tão vazio como temos acreditado. Segundo essas especulações, o espaço poderia ser "encrespado" pelas chamadas flutuações da energia do ponto zero, um fenômeno previsto pela mecânica quântica.
O princípio da incerteza de Heisenberg, bem conhecido pela afirmação de que é impossível conhecer a posição de uma partícula e seu momento ao mesmo tempo, também exige que o vácuo do espaço contenha alguma forma de energia residual. Devido à asserção da igualdade entre energia e massa, acredita-se que essa energia do vácuo assuma a forma de "partículas virtuais" continuamente pulando para dentro e para fora da existência em nosso mundo.
Energia escura
Sugestões de que essa energia do vácuo de fato seja a enigmática substância chamada de Energia Escura têm causado furor entre os cientistas. A energia escura, um dos mistérios não solucionados da moderna cosmologia, compõe mais de 75% do Universo e é responsável pela aceleração de sua expansão.
Mas ela tem se provado elusiva e difícil de definir. Há muitas teorias tentando descrever a energia escura - quintessência, campos fantasmas, campos escalares caóticos, apenas para citar alguns - todos eles conceitos nada intuitivos e ainda não fundamentados.
Como uma explicação alternativa, a energia do ponto zero é atraente ao atribuir um novo significado a um conceito que já está aí há décadas e está bem fundamentado em outra teoria.
Tunelamento em junções Josephson
O grande problema, contudo, vem a seguir: criar um experimento que dê algum fundamento a essa nova proposta. Embora todos os grandes experimentos espaciais, atuais e projetados, procurem de alguma forma lançar luzes sobre a energia e a matéria escuras, os Drs. Paul Warburton e Jon Fenton acreditam poder fazer melhor e mais barato: eles querem demonstrar a existência da energia escura em laboratório.
Eles estão usando componentes que podem dar algumas respostas, componentes eletrônicos baseados nas bem conhecidas junções Josephson.
As junções Josephson são minúsculos componentes eletrônicos formados por fitas de material supercondutor, no qual uma corrente elétrica flui sem resistência, separadas por uma finíssima camada isolante.
Nesse experimento pode-se verificar outra consequência do princípio da incerteza de Heisenberg - aquele acerca da probabilidade de que um elétron esteja localizado na camada de isolamento e, sob certas circunstâncias, ele possa de fato "tunelar" através da camada isolante, o que resultaria em um fluxo de corrente.
Interessados no ruído
Como em qualquer aparato eletrônico, os efeitos do ruído de fundo devem ser levados em conta. Mas, enquanto na maioria dos experimentos o ruído é um incômodo que deve ser minimizado ao máximo, nesta experiência a área de real interesse é um componente no espectro do ruído.
A baixas temperaturas, quando as excitações termais no material supercondutor são de alguma forma suprimidas, a corrente devida ao ruído é dominada pelas flutuações do ponto zero. O potencial para a demonstração, ou pelo menos para uma evidência convincente, se a energia do vácuo é de fato a energia escura, reside no limite imposto sobre a energia do vácuo pelas observações astronômicas acerca da quantidade de energia escura no Universo. O valor finito da densidade da energia escura impõe que a equipe de pesquisadores não deverá observar correntes geradas pelas flutuações do ponto zero acima de uma frequência crítica de 1,7 THz.
O maior desafio agora é desenvolver o equipamento experimental capaz de medir o ruído de fundo em frequências tão elevadas. Explorando as propriedades dos supercondutores de alta temperatura, a equipe do London Centre for Nanotechnology espera fazer medições ao longo da faixa crítica de frequências dos THz.
Busca por respostas
As implicações da verificação do limite superior e a conexão da energia do vácuo com a energia escura poderão ser gigantescas, lançando luzes sobre a formação do nosso universo e permitindo previsões sobre o seu futuro.
Mas, na atmosfera de incerteza e mesmo controvérsia envolvendo a teoria, quaisquer respostas para a questão se podemos de fato medir a energia escura em laboratório será um passo bem-vindo nessa longa busca por respostas.