Redação do Site Inovação Tecnológica - 23/11/2023
Refluxo quântico
Fazer os raios de luz - ou mesmo os fótons - girarem num sentido ou noutro, formando a assim chamada "luz torcida", não é nenhuma novidade, e já vem sendo explorado para inúmeras aplicações, como esculpir a luz em 3D para carregar mais informações ou eventualmente até mesmo substituir os transistores e fazer a computação mais rápida.
Mas agora Bohnishikha Ghosh e colegas da Universidade de Varsóvia, na Polônia, foram além e sobrepuseram dois feixes de luz torcidos no sentido horário, e isso surpreendentemente resultou em torções no sentido anti-horário nas regiões escuras da superposição dos dois feixes iniciais. Em outras palavras, girar dois feixes de luz num sentido resultou num giro da "escuridão" no sentido oposto. E essa torção no lado escuro tem momento, graças à chamada pressão de radiação da luz.
Esta descoberta tem implicações para o estudo das interações luz-matéria e representa um passo crucial em direção à observação e ao proveito integral de um fenômeno peculiar conhecido como "refluxo quântico", uma espécie de "bumerangue de luz".
"Imagine que você está jogando uma bola de tênis. A bola começa a avançar com impulso positivo. Se a bola não atingir um obstáculo, é improvável que você espere que ela mude de direção repentinamente e volte para você como um bumerangue. Quando você gira uma bola no sentido horário, por exemplo, você espera que ela continue girando na mesma direção," ilustra Bohnishikha.
Porém, tudo fica mais interessante quando, em vez de uma bola de tênis, estamos lidando com partículas em escala atômica regidas pelas leis da mecânica quântica - em vez de posições definidas, essas partículas podem estar em superposições, ou seja, podem estar em várias posições ao mesmo tempo, só "escolhendo" uma delas quando você faz uma medição.
Isso abre a possibilidade de que as partículas quânticas se comportem de maneira até oposta à bola de tênis: Elas podem ter a probabilidade de se mover para trás ou girar na direção oposta durante determinados intervalos de tempo. "Os físicos chamam esse fenômeno de refluxo," explica Bohnishikha.
Momento angular orbital
Para observar o fenômeno do refluxo em um sistema quântico pela primeira vez, os pesquisadores usaram um sensor de frente de onda, que consiste em um conjunto de microlentes colocado na frente de um sensor CMOS, permitindo fazer medições espaciais bidimensionais com alta sensibilidade.
"Investigamos a superposição de dois feixes carregando apenas momento angular orbital negativo e observamos, na região escura do padrão de interferência, um momento angular orbital local positivo. Este é o refluxo azimutal," disse o professor Bernard Gorzkowski.
Vale ressaltar que feixes de luz com dependência de fase azimutal (espiral) que carregam momento angular orbital foram gerados pela primeira vez há 20 anos usando lentes cilíndricas. Desde então, eles encontraram aplicações em diversos campos, como a microscopia óptica e as pinças ópticas, ferramentas que permitem a manipulação de objetos em micro e nanoescala, cujos criadores ganharam o Prêmio Nobel de Física de 2018.
Mas tudo deverá ficar mais poderoso e versátil tirando proveito do refluxo, que permitirá o uso não apenas do momento angular orbital positivo, mas também do "efeito bumerangue" da luz.
"O refluxo que apresentamos é uma manifestação de mudanças rápidas de fase, que podem ser importantes em aplicações que envolvem interações luz-matéria, como captura óptica ou no projeto de relógios atômicos ultraprecisos," concluiu Bohnishikha.