Com informações da Agência Fapesp - 06/10/2022
Monocristais
Pesquisadores brasileiros desenvolveram uma nova técnica para fabricar monocristais de alta qualidade.
Monocristais são materiais em que a rede cristalina é contínua e ininterrupta ao longo de toda a amostra. Os átomos ocupam posições regulares, que se repetem indefinidamente no espaço. Enquanto os policristais são compostos por muitos cristalitos de tamanho e orientação variados, os monocristais constituem um único grão, por isso sendo também conhecidos como "cristais únicos".
Esses cristais homogêneos e de alta pureza são essenciais para todos os estudos das propriedades físicas dos materiais, sobretudo quando estão envolvidas propriedades como a supercondutividade, magnetismo, semicondutividade e outras de interesse das tecnologias quânticas.
Existem várias técnicas para sintetizar monocristais, mas a mais utilizada é conhecida como CVT, sigla em inglês para transporte de vapor químico (Chemical Vapor Transport).
"O método CVT convencional consiste em uma reação química na qual o composto reage com o agente químico formando um complexo volátil. Esse complexo desloca-se até outra região do aparato experimental, com temperatura diferente daquela da zona onde ocorreu a primeira reação química. E, por fim, é depositado em forma de monocristal. Para ocorrer o crescimento do monocristal, um gradiente de temperatura é de fundamental importância, pois é ele que cria o potencial termodinâmico necessário," detalha o pesquisador Lucas Corrêa da USP de Lorena (SP).
Gradiente químico
No processo criado agora por Lucas e seus colegas, o gradiente térmico é substituído por um gradiente químico, o que simplifica e barateia muito a criação dos monocristais.
"Na nova técnica, que chamamos de 'transporte de vapor químico isotérmico' [ICVT - Isothermal Chemical Vapor Transport], o crescimento ocorre sem a necessidade de um gradiente de temperatura," destaca Lucas.
Isso elimina a necessidade de utilização de fornos de duas zonas, uma vez que o crescimento é isotérmico - isto é, a temperatura se mantém a mesma e constante em todo o forno, ou seja, basta um forno simples. Além disso, não há necessidade de ataque químico, uma vez que a pastilha do material semente já serve como ponto de nucleação, o que simplifica o processo de crescimento.
"Em um ambiente fechado, uma pastilha de material policristalino e um agente de transporte são postos em contato, em uma temperatura constante e suficientemente alta para que haja reação e formação de complexos gasosos. É razoável considerar que, no início, o agente de transporte reaja com a superfície do material policristalino, gerando um gradiente de potencial químico entre o interior dos grãos e a interface com a fase gasosa.
"Devido a esse gradiente que se forma, o equilíbrio termodinâmico entre fase gasosa e fase sólida não pode ser obtido. Assim, uma vez que a fase gasosa se torna saturada - o que é facilitado pelo emprego de quantidades muito pequenas de agente de transporte -, o potencial químico da pastilha se torna menor que o do gás. Nesse ponto, passa a ocorrer uma inversão do fluxo de massa e a superfície da própria pastilha serve como ponto para a nucleação dos monocristais," detalhou Lucas.
Outra vantagem é que a técnica produz cristais com uma qualidade cristalográfica muito alta, sem a ocorrência de cristais geminados.
Bi e tri-dimensionais
Embora o crescimento tenha sido obtido para materiais quase bidimensionais (ZrTe2, TiTe2 e HfTe2), os pesquisadores acreditam que o novo método possa ser aplicado a outros sistemas, em condições termodinâmicas adequadas.
Particularmente o ZrTe2 (telureto de zircônio) apresenta duas características de grande interesse, a supercondutividade e uma instabilidade, que compete com a supercondutividade, chamada onda de densidade de carga. Além da perspectiva de aplicação em computação quântica, essas propriedades tornam tais materiais ricos para o estudo de estados fundamentais da física do estado sólido.